terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Conferência Abolição de Fato!

Conferência Abolição de Fato!



A Secretaria Nacional do Movimento Negro realizou em Brasília, nos dias 15, 16 e 17 de janeiro de 2010, a Conferência Abolição de Fato!, programada como um processo de imersão para formação de lideranças, aptas a promover a organização do PDT, bem como da Secretaria mesma. Militantes de diversos estados da União, compromissados com o seu crescimento e auto-conhecimento, trocaram informações, e aprenderam a aprender. A Presidente da Secretaria Nacional do Movimento Negro do PDT, Dra. Edialeda Salgado do Nascimento, abriu o evento, explicando a necessidade de todos e de todas, levarem as informações ali recebidas para aqueles militantes que não puderam estar presentes a tão importante momento de qualificação política. Também agradeceu ao esforço de cada um para chegar até ali, e lamentou muito as ausências. Destacou a parceria da Direção Nacional do Partido, na pessoa do Presidente licenciado, Ministro Carlos Lupi. Na primeira mesa redonda, denominada Trabalho Emprego e Renda , ouviram-se os relatos da Dra. Candida Helena Machado, Ouvidora da Secretaria Municipal de Trabalho e Renda de Duque de Caxias, do Engenheiro Carlos Henrique de Mello, Superintendente Substituto do Ministério do Trabalho em Minas Gerais, do Administrador e Gestor Público Anderson Brito, Coordenador de Projetos do Ministério do Trabalho e Emprego, e do Dr. Ezequiel do Nascimento, atual Secretário de Políticas Públicas de Emprego do mesmo MTE. Além das experiências de cada um, discutiu-se o processo de gestão e montagem do PLANSEQ para Profissionais Afro brasileiros, apresentado pela Secretaria Nacional do Movimento Negro do PDT, ao Ministro Carlos Lupi, em 2008, em nome de entidades do Movimento Negro de todo o Brasil, e cuja Audiência de Concertação aconteceu em janeiro de 2009. Atualmente o PLANSEQ está em fase de implementação. O Dr. Ezequiel Nascimento, responsável pela coordenação dos PLANSEQs, (Planos Setoriais de Qualificação) e PLANTEQs, (Planos Setoriais de Qualificação), sugeriu uma série de parcerias entre o Ministério e a Secretaria do Movimento Negro, visando aumentar o aporte de recursos para as entidades, interessadas no trabalho de qualificação profissional dos afro-descendentes.


Na mesa seguinte, Experiências Educacionais de Sucesso, o Senador Cristovam Buarque, um permanente ativista da causa da Educação, a principal bandeira programática do PDT , ouviu, e certamente aprendeu muito, com as histórias de vidas dedicadas à educação, relatadas por nossas companheiras: Educadora Social Maria Alice Santos, Dra. Creuzely Ferreira da Silva, Professora e Bióloga Maria Christina Ramos da Silva, Professora Carmem Maria Amora e Professora Maria Cristina da Rosa. O Prof. Cristovam Buarque, ex Reitor da Universidade de Brasília, ex Ministro de Educação e ex Governador de Brasília, onde implantou a Bolsa Escola, lembrou as vitórias, poucas, e as necessidades muitas, referentes à real urgência da implantação de uma escola de qualidade para todos os brasileiros.
No final das atividades, o Teólogo Iron Muller, apresentou palestra explicativa, sobre como estabelecer a melhor e mais produtiva comunicação entre pessoas e entre grupos.
No segundo dia, Ronaldo Santos, especialista em descobrir e usar Habilidades e Competências, abriu janelas de conhecimento sobre o tema, e o Engenheiro Carlos Henrique de Mello através de Dinâmicas, esclareceu os processos de auto-conhecimento, para que se possa aplicar esta habilidade nas relações interpessoais e políticas. Em sua palestra, o Geógrafo e Mestre em Engenharia de Meio Ambiente, Sandro Correia, explanou sobre a urgência que tem todas as nações, e não somente o Brasil, de apresentar soluções para o desenvolvimento social de todos os cidadãos.
O Engenheiro Ambiental Ubiratan Nogueira, que já realizou a implantação de água em dois quilombos remanescentes de Minas Gerais, e que a pedido da Dra. Edialeda Salgado do Nascimento formulou o chamado Projeto Caixa D’água, de abrangência nacional, que visa levar água corrente a todos os quilombos do Brasil, explicou sobre a viabilidade do mesmo projeto, e dos benefícios trazidos levados por este ao crescimento e desenvolvimento social e econômico das populações quilombolas. Para esclarecimento da importância de semelhante investimento social, a pesquisa, efetuada pelo Dr. Ubiratan Nogueira e por Iron Müller, revelou a existência de cerca de cinco mil quilombos remanescentes reconhecidos pela Fundação Palmares, e um número quase igual, ainda em fase de reconhecimento. Segundo os dados do IBGE, a população quilombola alcança mais de um milhão de pessoas. O projeto foi apresentado ao Ministro Carlos Lupi, que prometeu agir como padrinho do mesmo, para o sucesso de sua execução. O Pedagogo e Bacharel em Direito Antonio Brás da Silva, trouxe considerações sobre a situação de extrema carência de recursos das 100 comunidades


quilombolas no Estado do Paraná, onde as autoridades locais demonstram grande insensibilidade para com esta causa. Anderson Brito falou de novos conhecimentos acerca do Marketing eleitoral, uma vez que há grande demanda pela eleição de companheiras e companheiros negros na eleição de 2010, e nas próximas, meta que poderá ser alcançada, se houver um preparo de coordenadas estratégicas variadas desde agora.
Na manhã de domingo, dia 17, estabelecido como o momento de troca de informações gerais, e apresentação pessoal, todos e todas, falaram de suas vivências nos movimentos sociais, comprovando a tese da integração entre estes, e os compromissos políticos do PDT. Foram apresentadas duas Moções: de apoio à população do Haiti, partindo do estudo da melhor maneira de ajudá-la, de fato, e Moção de endosso à indicação do ex-Senador Abdias do Nascimento ao Premio Nobel da Paz em 2010. Os textos dos palestrantes serão publicados em breve, levando assim, aos companheiros e companheiras, de todo o Brasil, a realização do propósito da Conferência Abolição de Fato!: informar para formar ativistas políticos dentro do PDT, realizando com o auto-conhecimento e a auto-estima, o seu processo de crescimento.



Fotos: Michelli Luise







segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Quilombolas no Paraná

A SITUAÇÃO DAS COMUNIDADES NEGRAS TRADICIONAIS E REMANESCENTES DE QUILOMBOS DO PARANÁ


Antonio Bras da Silva
Formado em Pedagogia e Bacharel em Direito; Especialista História e Cultura Africana e Afrobrasileira e Ações Afirmativas no Brasil; Presidente da Secretaria Regional do Movimento Negro do PDT/PR.



Resumo
O presente artigo visa mostrar a situação das comunidades quilombolas no Estado do Paraná, principalmente nos aspectos relacionados à saúde, educação e trabalho, baseando-se nos levantamentos realizados pelo Grupo de Trabalho Clóvis Moura, bem como as ações já realizadas para a melhoria na qualidade de vida dos quilombolas e as necessidades identificadas, que ainda precisam de uma ação mais efetiva de políticas públicas capazes de atender tais necessidades




INTRODUÇÃO


Muito se tem escrito sobre quilombos no Brasil havendo inúmeras publicações que abordam teoricamente, nas áreas das ciências sociais, questões sobre eles, da sua gente, retratando suas múltiplas dimensões, focando, entre outros tantos aspectos, os elementos tradicionais das comunidades negras.
As comunidades de remanescentes de quilombolas estão em áreas que trazem consigo as marcas da história da resistência negra à escravidão no Brasil.
A maior parte dos territórios quilombolas formou-se em áreas pouco agricultáveis, também chamadas de “terras dobradas” por serem regiões de pouco interesse e difícil acesso, gerando o isolamento dessas comunidades e com isso uma série de especificidades no tratamento dos bens materiais e imateriais.
Tendo clara a necessidade de tratamento diferenciado aos cidadãos remanescentes das comunidades quilombolas, a Constituição Federal, no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), consagra-lhes o direito à propriedade de suas terras, sendo considerado um importante instrumento jurídico para fundamentar a construção de uma política fundiária baseada no princípio de respeito aos direitos territoriais dos grupos étnicos tradicionais.
A forma como a revelação da existência das Comunidades Remanescentes de Quilombos – CRQs, “Terras de Pretos” ou de Comunidades Negras Tradicionais - CNTs, se apresentou no Paraná difere em muito de outros estados onde o trabalho junto a tais grupos, já se desenvolve, em avançado processo nos seus levantamentos, sistematização e planejamento das políticas aplicáveis a tais universos.
Em novembro de 2004, durante o I Encontro de Educadores/as Negros/as do Paraná, chamado pelo Movimento Negro e com amplo apoio do Governo do Estado, as informações trazidas à tona por seus participantes provocaram o conhecimento de um outro quadro e o interesse, pois os indicativos aumentavam o número de comunidades possíveis para oito ou, quem sabe, até para 10 ainda que não muito bem definidas e/ou localizadas.
O debate alcançado no encontro criou uma grande expectativa entre os educadores e as Secretarias de Estado da Educação, da Cultura e a Especial para Assuntos Estratégicos, que inicialmente trocando informações, se viram compelidas a conhecer tal realidade, cada qual sob seu enfoque.
Com o objetivo de apresentar os diagnósticos sócio-econômicos e educacionais das Comunidades Quilombolas, bem como da discussão de políticas públicas de Estado que estão sendo construídas nas áreas da Educação e Assistência Técnica Rural, a Secretaria da Educação do Paraná (SEED/PR) em parceira com o Grupo de Trabalho Clóvis Moura promoveu o Encontro de Educação e Políticas Públicas para as Comunidades Quilombolas do Paraná no Centro de Formação Continuada Faxinal do Céu, no município de Pinhão, no período de 12 a 16 de julho de 2009.
O evento contou com a participação de aproximadamente 300 pessoas representantes de comunidades remanescentes de Quilombo, além da participação do Ministério Público do Paraná, dos promotores públicos, dos secretários municipais de educação e dos representantes das instituições envolvidas com as questões dos quilombolas.
Durante o Encontro, vários grupos tiveram a oportunidade de expor suas dificuldades e fazer reivindicações para melhoria no atendimento das necessidades básicas das comunidades e puderam ouvir dos palestrantes orientações e esclarecimentos sobre seus direitos, sobre projetos e programas dos governos e foram incentivados para que as comunidades quilombolas possam transformar as ações de políticas públicas em realidade para os quilombolas.

COMUNIDADES NEGRAS TRADICIONAIS E REMANESCENTES DE QUILOMBOS DO PARANÁ

Em 1853, quando ocorreu a emancipação política do Paraná, 40% da população do Estado era composta por negros. Hoje, segundo dados do IBGE, eles representam 28,5%, o que confere ao Paraná a maior população negra do Sul do país.
A visão de um Paraná sem a existência de população negra vem sendo substituída pela realidade de uma cidadania tardiamente reconhecida, para compor o território paranaense.
O presente artigo foi elaborado com base no trabalho de pesquisa realizado pelo Grupo de Trabalho Clóvis Moura (GTCM) no período de 2005 a 2008, onde são apresentados os dados e as estatísticas do que foi alcançado, no Levantamento Básico de Comunidades Negras, remanescentes de quilombos ou não, historicamente e até agora invisibilizadas e/ou suprimidas pelas diversas esferas do poder e da sociedade civil, para, além de reavaliar a presença dos pressupostos africanos no Estado, atingir objetivos mais imediatos: torná-las alvo de políticas públicas que estão sendo disponibilizadas a outras comunidades e segmentos sociais, em ação de inclusão social
Assim, pretende-se demonstrar a situação das Comunidades Negras Tradicionais e Remanescentes dos Quilombos no Estado do Paraná, com o objetivo de subsidiar a construção de um modelo de Política Pública para o desenvolvimento sustentável para estas Comunidades.
Deste modo, dos trabalhos de campo realizados pelo GTCM, no mapeamento e identificação destas comunidades foram selecionados os dados que descrevem o perfil populacional das comunidades; as condições de vida nas comunidades quilombolas; a situação sobre a educação e saúde; a participação em programas assistenciais; as fontes de geração de renda; pois são aspectos mensuráveis, que retratam a situação dessas comunidades.
Hoje, essa população está distribuída em mais ou menos 100 (cem) comunidades, que sobrevivem da agricultura de subsistência, caça, pesca e extrativismo, sendo que somente 36 destes grupos familiares foram certificados pela Fundação Cultural Palmares, já que se auto declararam como Comunidades de Remanescentes de Quilombos.
Entre os vários problemas nessas comunidades o mais grave, é a falta de documentação básica. Muitos sequer têm certidão de nascimento, que é gratuita e assegurada na Constituição Federal — gratuidade é do desconhecimento de todos, ou seja, essas pessoas não existem para o Estado.
A falta dos documentos, Carteira de Identidade, CPF, Título de Eleitor torna essas pessoas excluídas do seu direito de cidadania, impossibilitando-os de reivindicar seus direitos.
Outra questão que aflige os moradores das Comunidades é a falta de registro de suas terras. Essas pessoas habitam a terra há muitos anos, séculos, transmitindo-a geração após geração, porém sem qualquer documentação que torne legal a sua posse sobre as mesmas.
Para mapear as comunidades quilombolas do Paraná, o grupo de trabalho Clóvis Moura iniciou a partir de 2003, a identificação de áreas e de populações de negros remanescentes de quilombos no Paraná, visando levantar dados a respeito da escolaridade, ocupação, benefícios sociais, população, acesso à saúde e educação dessas populações. Já são 50 as áreas identificadas e 36 classificadas pela fundação Palmares, resultados de um trabalho de sete anos.
Estas áreas estão localizadas no Vale do Ribeira, no Sudeste e no Norte Pioneiro e estão agrupadas em 6 (seis) mesorregiões, sendo a que a Mesorregião Metropolitana de Curitiba é a maior delas, com 4 (quatro) microrregiões. As demais Mesorregiões são: Centro-Oriental Paranaense, Centro-Sul Paranaense, Sudeste Paranaense, Oeste Paranaense e Norte Pioneiro Paranaense.

Educação nas Comunidades Quilombolas do Paraná

A situação da educação nas comunidades quilombolas do Paraná se insere na problemática educacional do país. Ainda é comum observar crianças e adolescentes fora da escola e pessoas adultas analfabetas.
As comunidades têm deficiências escolares que vão desde a dificuldade de acesso, nas localidades onde há escola, mesmo em condições precárias, até a ausência completa de iniciativas que permitam que se chegue ao universo escolar.
De acordo com o Censo Escolar de 2007, o Paraná possui 2.228 alunos matriculados em 17 escolas localizadas em áreas remanescentes de quilombos.
A maioria da população tem idade entre 18 e 65 anos e o índice de analfabetismo é relativamente alto, em torno de 10% a 12% e em algumas comunidades os que concluem a 4ª série não passam de 30% e menos de 10% possui o Ensino Fundamental completo.
A população com idade entre 14 e 18 anos é bastante reduzida, mas apresenta maior índice de escolaridade: apenas 20% cursou somente até a 4ª série, boa parte possui Ensino Médio e proporcionalmente é a população que mais atingiu o nível Pós Médio. É, também, a faixa etária com menor incidência de analfabetismo, apenas 4%.
A dificuldade de acesso à escola é, com certeza, o fator que mais contribui para esse quadro. Enquanto em algumas poucas comunidades há pelo menos uma escola de 1ª à 4ª série, para atender a população, em outras a escola está localizada a uma distância de até 40 km. O transporte dos alunos, realizado em ônibus, kombis, vans e automóveis muito antigos, comprometem a segurança dos usuários.
A permanência dos alunos nessas escolas torna-se um problema evidente, quando aliado à distância percorrida até chegar ao local (ponto) por onde passam esses transportes. Isso contribui para a desmotivação da criança, do jovem e até do adulto para ir ao encontro da instrução escolar.
E, por fim, os conteúdos programáticos destas instituições, na maioria das vezes, não mantêm uma aproximação dos saberes locais, sem percepção identitária e sem a interação comunidade tradicional / sociedade contemporânea.
Dentre as ações afirmativas da Secretaria de Educação do Paraná está a criação do Núcleo de Educação das Relações Etnorraciais e da Afro-descendência, o desenvolvimento de conteúdos educacionais próprios para as comunidades quilombolas, a construção de escolas e a capacitação de professores para atuarem na educação de jovens e adultos nas localidades onde vivem os quilombolas.

Condições de vida de produção e cultura nas comunidades tradicionais negras e quilombolas no Estado do Paraná

Em sua forma de organização social e de produção — quando há abundância de terras para plantar, estas populações seguem normas e critérios praticados pelos mais antigos, ou seja, pelos fundadores da Comunidade, com quem aprenderam fazendo questão de manter e preservar este conhecimento.
Possuem a mesma forma de organização cooperativista que possibilitou no passado e possibilita ainda nos dias de hoje, uma economia de abundância, ou seja, uma economia de subsistência, com pequenos roçados, produzindo de tudo para o sustento da família e das criações.
Com base na diversificada agricultura praticada nos Quilombos e nas Comunidades Tradicionais Negras Paranaenses, pelos grupos familiares que nelas habitam, passam as pequenas lavouras de mandioca, milho, banana e feijão a ter um relevante destaque no panorama alimentar da população em comparação com a agricultura praticada nos latifúndios.
O trabalho geralmente é realizado por homem e mulher com idade e condições físicas no limite para a sua execução, no entanto, não é difícil encontrar também crianças menores de 14 anos de idade realizando funções destinadas a adultos.
Com exceção, da função “trabalhadores avulsos”, há um elevado percentual de pessoas desocupadas em todas as faixas etárias, sobretudo entre a população economicamente ativa (idade entre 18 a 65 anos) da região.
Atualmente, 22 comunidades já têm programas de hortas comunitárias feitas pela Emater, que preservam as características culturais de cada grupo.
Hoje em dia, as Comunidades Negras sobrevivem de suas atividades na terra como: plantio, colheita, coleta de frutos nativos regionais e da produção de subsistência. Sobrevivem também da caça, quando ela existe, da pesca, da plantação de bananas, do palmito, na região do litoral paranaense.
Por serem os quilombos, comunidades basicamente agrícolas, a ocupação formal no mercado de trabalho é muito pequena, apenas 11%, e boa parcela da população trabalha como bóia-fria.
Outro aspecto considerado na geração de renda das comunidades remanescentes de quilombos e comunidades negras tradicionais, são os benefícios sociais que os moradores recebem, porém somente uma parcela muito pequena dos moradores conta com tais aquisições.
A quase totalidade (96,7%) da população não conta com nenhum benefício social, mesmo aqueles que deveriam fazer parte da aquisição obrigatória, como bolsa família, bolsa escola etc. Talvez, o baixo número de crianças nas escolas e a ausência de documentos pessoais são elementos que contribuem para esta situação.
Para promover uma mudança nessa situação, a Secretaria Especial de Relações com a Comunidade desenvolve projetos que trabalham diretamente com comunidades quilombolas, dentro do Programa Universidade Sem Fronteiras. Os projetos vão da assistência técnica e capacitação em agroecologia até o trabalho com identidade cultural das comunidades. Grande parte dos projetos é voltada para a geração de emprego e renda para as comunidades, como o projeto Roteiro Kundun Balê – Turismo como estratégia de fixação territorial e afirmação cultural na Comunidade Quilombola Paiol de Telha, feito no centro-oeste do Paraná, na região de Guarapuava.

Saúde e condições sócio ambientais

Existe uma série de dificuldades e reinvidicações que, embora não estejam relatadas por comunidades específicas, apontaram seus principais problemas.
Em muitas comunidades não existe assistência médica, odontológica e outros recursos para o funcionamento dos postos de saúde (equipamentos, medicamentos e até mesmo de profissionais habilitados nas especificidades dos problemas de saúde da população negra.
Os Postos de Saúde, quando existem, ficam distantes das comunidades e em algumas localidades o hospital chega a mais de 100 Km de distância.
A falta de saneamento básico contamina o solo e a água, fato que explica a grande quantidade de crianças e adultos apresentando sintomas graves de verminoses. Também não há orientação e assistência para gestantes, além do planejamento familiar, afetando a saúde e a qualidade de vida dessas comunidades.
As doenças mais comuns na população negra, que exigem a presença de profissionais com conhecimentos na área são: anemia falciforme, hipertensão, diabetes, glaucoma, dentre outras.
Outro aspecto relevante a ser considerado é a medicina caseira baseada em conhecimentos etnobotânicos e etnobiológicos dessas comunidades. Podemos afirmar com certeza que essas comunidades só sobreviveram à total ausência das políticas públicas de saúde porque contavam com seus conhecimentos tradicionais.
Infelizmente, ainda não há, com raras exceções, uma política de incentivo ao uso de remédios caseiros por parte dos órgãos governamentais brasileiros.
Seria importante implantar, nessas comunidades, programas que valorizassem os conhecimentos tradicionais em plantas medicinais; além de possibilitar a capacitação, disponibilizando aos quilombolas uma referência teórica sobre as plantas medicinais usadas na preparação de remédios caseiros por eles usados, incluindo cuidados no preparo, na coleta e no armazenamento das ervas, contribuindo para gerar segurança nos remédios produzidos por eles.
Há um longo caminho a ser percorrido, e muitos desafios a serem vencidos pela Secretaria de Saúde (SESA), que pretende executar um programa de incentivo, treinamento e qualificação às Secretarias Municipais de Saúde, de ação nas comunidades quilombolas e sobre a Saúde da População Negra, inclusive com a criação do Comitê Gestor de Saúde da População Negra.

Considerações Finais

Os quilombos têm uma importância histórica muito grande, pois não são apenas uma reunião de afro-descendentes, mas os quilombolas já trabalham, há varias gerações, como uma cooperativa, eles carregam toda uma questão de trabalho comunitário.
O trabalho de campo realizados pelo GTCM, no mapeamento e identificação das comunidades quilombolas no Paraná, possibilitaram uma visão mais ampla e clara do perfil populacional dessas comunidades, as condições de vida; a situação sobre a educação e saúde; a participação em programas assistenciais; as fontes de geração de renda, que retratam a situação dessas comunidades.
A partir dos levantamentos, o grupo se articulou com o governo estadual e federal para reconhecer os direitos básicos (água, luz, moradia, educação) das comunidades e incluí-las em programas sociais. Das 50 comunidades visitadas, 14 já são reconhecidas pelo governo federal e pela Fundação Quilombo dos Palmares como quilombolas.
O apoio estadual veio através do programa “Revelando um Paraná Quilombola”. O governo está ouvindo os quilombolas, o que é inédito na história do país, para que a partir de agora essas comunidades possam se desenvolver com mais segurança, com seus direitos de cidadania garantidos.
É preciso refletir sobre possíveis caminhos para interagir com estas comunidades, a fim de promover as mudanças que elas julgarem necessárias. É de suma importância investigar a forma como a comunidade constrói suas representações de mundo, as quais interferem diretamente nas práticas relacionadas ao dia a dia.
A partir das reivindicações construídas pelos moradores locais, faz-se necessário articulá-los às entidades políticas que possam efetivamente transformar esses projetos em políticas públicas para a região.
É importante sempre preservar e incentivar a autonomia da comunidade em suas decisões e na sua participação política, pois se não forem eles mesmo os fomentadores das mudanças que desejam para si, não vemos como as ações podem ter durabilidade e impactos significativos.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Abolição de Fato!

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Movimento Negro faz encontro nacional em Brasília

Publicado em 17 Jan 2010 por PDT

Secretaria do Movimento Negro do PDT faz encontro nacional em Brasília
O PDT, partido político pioneiro na criação de espaço para a defesa dos direitos dos negros, realizar neste final de semana, de sexta (15/01) a domingo (17/1), em Brasília, a I Conferência Abolição de Fato, sob a coordenação da médica e militante Edialeda Salgado do Nascimento, presidente da Secretaria Nacional do Movimento Negro do PDT.
O evento, segundo Edialeda, tem por objetivo “potencializar as habilidades e competências dos militantes, motivando-os a uma participação ativa e eficiente nas ações desenvolvidas pela Secretaria do Movimento Negro do nosso partido, inclusive com vistas ao nosso desempenho nas eleições de 2010”.
Edialeda, que foi guindada por Brizola à condição de ícone das ações pedetistas na defesa do Movimento Negro ao ser nomeada para a Secretaria de Promoções Sociais do Governo fluminense já na primeira gestão de Brizola, faz um apelo para que todos compareçam ao evento, “que será um momento importante para nossa consolidação como força política no conjunto nacional”.
A dirigente lembrou que o tema escolhido para conferência – “O Militante Negro e a Gestão Pública Responsável”, será discutido a partir de propostas que abordam a temática de captação e gestão de verbas, desenvolvimento de habilidades e competências pessoais e sua articulação com as políticas públicas, principalmente as relacionadas à Assistência Social e de Saúde; Educação e Cultura; Esporte e Lazer; e Trabalho, Emprego e Renda.
Ainda segundo Edialeda, os eixos temáticos da conferência serão: I – O Militante Negro e os desafios para o Desenvolvimento e a Sustentabilidade Ambiental, Social, Cultural e Esportiva; II – Trabalho, Emprego e Renda: desafios dos processos de qualificação profissional e geração trabalho, emprego e renda no Brasil; e III – Democracia, Educação, Profissionalização e Adequação às Novas Realidades: políticas para a construção de movimentos negros sustentáveis,
Estão previstas as palestras da própria Edialeda, do Senador Cristovam Buarque; do Secretário de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho, Ezequiel Souza do Nascimento; do Coordenador Geral de Estudos do Ministério, Anderson Brito Pereira; do Superintendente Regional do Trabalho de Minas Gerais, Carlos Henrique Ramos Mello Filho; o Secretário Municipal de Esportes e Cidadania de Cuiabá, Aurélio Augusto; do professor Sandro dos Santos Correia – Mestre em Engenharia . Ambiental . Urbana da UNEB; do engenheiro ambiental Ubiratan Nogueira; do especialista em Gestão de Pessoas, Ronaldo Santos; e do teólogo Iron Muller.
O evento, aberto nesta sexta-feira, será encerrado no comingo, obedecendo à seguinte programação:
1º Dia – 15 de janeiro
Das 08h às 12h – Credenciamento; Das 12h às 13h
Almoço; Das 13h às 14h -
Abertura – Dra. Edialeda Salgado Nascimento;
Das 14h às 14h40min - Palestra - Trabalho, Emprego e Renda - Dr. Ezequiel Nascimento; Das 14h40min às 16h - Mesa Redonda – Trabalho, Emprego e Renda - Ezequiel Nascimento, Dra. Edialeda Salgado, Dr. Anderson Brito, Dr. Carlos Henrique e Aurélio Augusto -
Das 16h às 16h40min - Mesa Redonda - Experiências Educacionais de Sucesso - Dra. Creuzely Ferreira da Silva, Sra. Maria Alice Santos, Profª. Maria Christina Ramos e Profª. Maria Cristina da Rosa;
Das 16h40min às 18h - Palestra - Educacionismo – Dr. Cristovam Buarque;
Das 18h às 19h - Apresentação da Plenária; Das 19h às 21h30min Dinâmica – Dr. Carlos Henrique; 21h30min – Jantar.
2º Dia – 16 de janeiro
Das 08h às 10h - Processo de Comunicação – Iron Muller;
Das 10h às 12h - Habilidades e Competências – Ronaldo Santos;
Das 12h às 13h30 – Almoço;
das 13h30 às 15h30 Preconceito Estrutural – Jorn. Aurélio Augusto Gonçalves;
15h30 às 17h30 Marketing Eleitoral – Dr. Anderson Brito; Das 17h30 às 18h30 -Palestra – Meio Ambiente e Desenvolvimento Social – Dr. Sandro Santos Correia;
Das 18h30 às 19h30 - Palestra – Quilombos e Quilombolas (Caixa D’Água) – Dr. Ubiratan Nogueira;
Das 19h30 às 20h30 - Mesa de Discussão – Quilombos e Quilombolas - com. Ivaldo Paixão, Dr. Antonio Brás e Profª. Ana Poty Medeiros;
21h30 – Jantar.
3º Dia – 17 de janeiro
Das 08h às 10h – Plenária;
Das 10h às 13h – Encerramento.
Fonte: PDT

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Esporte e Racismo

ANDRADE – craque dentro das quatro linhas, craque como técnico-estrategista, orgulho afrodescendente

por Ricardo Riso

Um aspecto importante do jogo em que o Flamengo pode se tornar campeão brasileiro não vem sendo abordado pelos grandes meios de comunicação e que poderia motivar as complicadas relações étnicorraciais na sociedade brasileira: trata-se do técnico rubro-negro Andrade, que poderá se tornar o primeiro técnico negro a ser campeão do principal torneio nacional. E por uma feliz coincidência, o jogo decisivo será no Maracanã, cujo nome oficial é o do autor do histórico livro “O negro no futebol brasileiro” (1947), Mário Filho, irmão de Nelson Rodrigues. Filho, em seu trabalho pioneiro, aponta as discriminações sofridas pelo negro para ser aceito no meio do futebol.

O negro no futebol brasileiro só aparece com destaque como jogador. Foi assim desde que o ludopédio se instalou em nossas terras ao final do século XIX. De esporte de elite proibido aos negros, foi se popularizando entre as classes populares e, somente em 1923, que um clube abriu as portas para jogadores negros: o Vasco da Gama. Aos poucos, os afrodescendentes foram ocupando os espaços nos clubes e na seleção brasileira, mas o jogador tinha que seguir a máxima de que “não basta ser bom, é preciso ser o melhor” para ser aceito.

Talvez o período em que o racismo tenha sido escancarado no futebol tenha acontecido na derrota para o Uruguai, na final da Copa de 1950, no supracitado Maracanã. Naquela ocasião, o jogador Bigode e o goleiro Barbosa foram acusados como os responsáveis pela derrota brasileira por não conseguirem impedir o atacante Ghighia de marcar o gol da vitória. Esse acontecimento motivou a imprensa e parte da sociedade a exigir que negros e mestiços não fossem mais convocados para a seleção. Uma profunda bobagem, pois, passados oito anos, o Brasil seria campeão do mundo na Suécia com o mestiço e genial Garrincha e os negros Pelé (que se tornaria o Rei do Futebol) e Didi. Este, eleito o melhor jogador da competição.

Entretanto, a discriminação não poupou seus esforços. Barbosa sempre foi lembrado por sua falha e, em 1993, o ex-goleiro, já um senhor, talvez tenha sofrido a sua maior humilhação. Ele quis visitar os jogadores da seleção que estavam concentrados para um jogo das eliminatórias da Copa de 1994, mas foi proibido de entrar no hotel. Muitos goleiros negros sofreram com essa “maldição”, tanto que a seleção brasileira só voltou a ter um arqueiro afrodescendente com Dida na Copa de 2006.

Contudo, o racismo não se apresenta apenas dentro das quatro linhas. Só encontramos negros ocupando funções menores como roupeiros e massagistas, ainda assim imprescindíveis, nos clubes, mas jamais postos de liderança. Entre dirigentes e presidentes não vemos afrodescendentes trabalhando nesses cargos nos principais times do país. Essa reflexão pode ser ampliada à presença negra entre árbitros e jornalistas esportivos. Por coincidência, mínima também.

Por isso, o momento atual de Andrade como técnico e a expectativa do título brasileiro força-nos a pensar e a discutir as relações étnicorraciais dentro do futebol, principalmente por sermos a “pátria de chuteiras”. Por conseguinte, as práticas no futebol refletem a nossa sociedade.

Para ser técnico é preciso que o pretendente possua algumas características como liderança, conhecimento tático e capacidade intelectual. Nenhuma delas é associada ao jogador negro que se vale de sua força física para compensar a inteligência reduzida e do dom natural para minimizar suas falhas táticas no esquema do time. Isso já serve como justificativa para que o ex-jogador negro seja incapaz para exercer a função de técnico, pois lhe faltaria a sapiência que um estrategista deveria ter. Ou seja, depreendemos que na mentalidade do futebol brasileiro permanecem os discursos positivistas do final do século XIX.

Entretanto, parece que Jorge Luís Andrade da Silva, o Andrade, quer mudar a história e mostrar que o afrodescendente é capaz sim, desde que tenha oportunidade de trabalhar. De 2004 para cá, Andrade já assumiu o clube como interino em três ocasiões e sempre entregou o time em situação melhor que quando entrou. Foi menosprezado por Cuca que chegou a colocá-lo para compor barreira em treinamentos e ouviu do atual goleiro Bruno, seu comandado, após uma discussão durante um treino que “ele poderia ter ganho tudo como jogador, mas como técnico ele não era ninguém”. Claro que Bruno foi execrado pela torcida e pela imprensa esportiva, indignados com o seu desrespeito a um ex-craque rubro-negro.

Como vemos, o Tromba, como era conhecido por seus companheiros no tempo de jogador, enfrentou situações desconfortáveis mas jamais veio a público reclamar por qualquer injustiça dentro do Flamengo. Sua resposta veio com o retrospecto da passagem atual pelo comando da equipe, em 2009 realiza seu melhor trabalho.

Até agora sua postura como técnico desde que foi efetivado pela diretoria, tem se caracterizado pela serenidade, controle emocional e humildade ao segurar a euforia dos jogadores e exaltar o trabalho do grupo; conhecimento tático ao buscar alternativas ofensivas e romper com o passado “retranqueiro” que dominou o Flamengo desde a passagem do técnico Joel Santana em 2007; educação e inteligência no trato com a imprensa não exibindo a truculência e a arrogância dos principais técnicos do Brasil, os “professores doutores” do futebol.

Além disso, Andrade é parte da história do Flamengo, exatamente no seu momento mais glorioso. Ele era o cabeça-de-área do time campeão do mundo liderado por Zico, o que o faz ter o carinho e o respeito da torcida. Enquanto jogador rubro-negro conquistou quatro títulos estaduais, quatro nacionais, uma libertadores e um mundial. Passou pelo rival Vasco da Gama e ganhou mais um brasileiro. Se a memória não me trair, Andrade é o jogador com o maior número de títulos nacionais desde que a CBF criou o campeonato brasileiro: cinco.

Na minha infância e adolescência ia muito aos jogos daquele grande time do Flamengo. Recordo-me que Andrade, ao início das partidas, sempre procurava enfiar a bola entre as pernas de seus marcadores (a famosa “caneta”), inflamando a torcida a empurrar o time para o ataque. E foi assim, de caneta em caneta que Andrade conseguiu romper o preconceito, se firmou como técnico e poderá viver mais um momento histórico no futebol caso seus comandados conquistem o título. Além disso, se tornará mais um motivo de orgulho para a população afrodescendente brasileira.
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Está na
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Andrade é o 1º negro campeão brasileiro como técnico
6/12/2009

Rio - Com a vitória por 2 a 1 do Flamengo sobre o Grêmio, neste domingo (06/12) no Maracanã, seu técnico, Jorge Luis Andrade da Silva, o ex-jogador Andrade (foto), entrou para a história do futebol tornando-se o primeiro treinador negro a conquistar o campeonato brasileiro.
Andrade já havia sido campeão brasileiro atuando pelo Flamengo nos anos de 1980, 1982, 1983 e 1987 (Módulo Verde da Copa União), além do título de 1989, com o Vasco.
O campeonato teve apenas dois treinadores negros: Sérgio Soares, do Santo André e Lula Pereira – atualmente desempregado. Na série B a presença negra igualmente é rara.
Segundo o jornalista Mário Filho – que dá nome ao estádio do Maracanã e é autor do clássico "O negro no Futebol brasileiro", de 1.947 - foram os negros que reinventaram o futebol no país, dando ao esporte características distintas do período em que era praticado apenas por filhos de ingleses ricos e aristrocratas.
Embora se constituam na esmagadora maioria nos campos, ainda são raros como técnicos ou cartolas.

Racismo: No caso de Andrade até o início do campeonato era treinador interino. Foi sub de nove técnicos até ser efetivado este ano. Segundo o também ex-jogador Júnior, agora comentarista da Globo, Andrade só não foi efetivado como técnico por racismo. Em 2004, quando era gerente de futebol do clube, Júnior disse ter tentado efetivá-lo no cargo, porém, revela ter ouvido, em meio aos comentários sobre inexperiência do treinador, argumentos racistas contra.
“No momento de colocações de virtudes e defeitos, vieram comentários deste tipo. Além da inexperiência no cargo, diziam que era um negro sem boa dicção”, contou.

Pó de Arroz
No início do futebol no Brasil (primeira década do século passado) os times não aceitavam jogadores negros. Para driblar a proibição os jogadores passaram a esticar o cabelo e a encher os rostos de pó de arroz para se passarem por brancos, evitando hostilidades das torcidas.
Em 1.914, o jogador Carlos Alberto, do Fluminense, foi vítima dessa tentativa de disfarce. Durante uma partida do seu time com o América, a maquiagem começou a escorrer revelando a sua verdadeira cor. Passou a ser chamado pela torcida adversária de Pó-de-Arroz.

Direitos Humanos e racismo no Brasil

domingo, 13 de dezembro de 2009

DE UM NEGRO PARA UM JURISTA BRANCO: PELA GRANDIOSIDADE DO BRASIL, REVEJA SEUS CONCEITOS!

Capitão Marinho*

Dia 10 de dezembro, é comemorado o Dia Internacional dos Direitos Humanos. Esta data é consequência da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, pela Assembléia Geral das Nações Unidas. Esta Declaração é o primeiro documento internacional que afirma a universalidade dos direitos fundamentais e a IGUALDADE entre todos os seres humanos. O Brasil, como país signatário da Declaração dos Direitos Humanos, é obrigado a promover políticas de igualdade e rechaçar qualquer conduta que mantenha estagnada a desigualdade entre os seres humanos – quer seja econômica, educacional, cultural ou étnica.

Passado mais de sessenta anos da Declaração, as políticas de promoção à igualdade, lamentavelmente, ainda encontra resistência de pessoas que têm um grande poder de formar e modificar opiniões, como o destacado jurista Ives Gandra – professor emérito das universidades Mackenzie e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército – que afirma: “Como modesto advogado, cidadão comum e branco, sinto-me discriminado e cada vez com menos espaço, nesta terra de castas e privilégios”. Fica a indagação: o quê ele pretende com esta afirmação? Retroceder à época da escravidão? Em plena época que todo o planeta entende que a diversidade e a igualdade entre os seres humanos é o maior bem que a humanidade pode ter, será que ele quer manter o fosso que separa negros e brancos?

Ora, se um eminente jurista, professor emérito de universidade, branco e milionário se acha discriminado, nesta terra de casta e privilégio, o que dirá o homem negro que foi espancado ontem, 12/12/09, em Ribeirão Preto-SP, por três universitários de medicina (Faculdade Barão de Mauá), que foram soltos minutos depois, porque o Juiz entendeu que o fato deles baterem em um homem desconhecido, gritando "toma nego" não caracteriza injúria racista? O que dirá os jovens negros que percebem, nitidamente, que uma pessoa atravessou a rua com medo de cruzar com ele na mesma calçada? O que dirá os 14,2 milhões de brasileiros adultos que são analfabetos? O que dirá os afrodescendentes que quando vêem a coluna social não se identifica fisicamente com ninguém? Ah, falar em coluna social, abordarei, no próximo parágrafo, a história de algumas famílias de imigrantes (obviamente brancos) que fizeram fortunas, algo IMPOSSÍVEL para os negros, pois naquela época (1870 a 1930), ou eles estavam no cativeiro vivendo de pão duro e água fria, ou estavam sendo tratados iguais a animais no Brasil que predominava a ideologia do médico e biólogo francês Louis Couty – política do branqueamento – que afirmava da necessidade de haver, no Brasil, imigração européia para “melhorar” o povo brasileiro.

Das inúmeras famílias brasileiras ditas tradicionais, vou tecer breve comentário sobre a Família Matarazzo, a Família Diniz e a Família Hering. Família Matarazzo: sua história tem início com a chegada de Francisco Matarazzo à cidade São Paulo em 1881. Nascido na província de Salermo, Itália. Imigrante com vantagens dadas pelo Brasil que explorava os negros; Família Diniz: sua história começou com a chegada de Valentim dos Santos Diniz à cidade de Santos-SP em 1929. Nascido em Polmares do Jarmelo, Portugal. Imigrante com vantagens dadas pelo Brasil que explorava os negros; Família Hering: originária de Hartha, na Alemanha, se estabeleceu em Blumenau-SC em 1878. Imigrante com vantagens dadas pelo Brasil que explorava os negros. Será que o Dr. Ives Gandra não conhece esta parte da história brasileira? Ou será que ele acha que as famílias brasileiras “tradicionais” são descendentes de africanos?

Confesso que este posicionamento do Dr. Ives Gandra ajuda-me a compreender porque o Exército, através da sua Editora (BIBLIEX), publicou, este ano (2009), um livro negando o racismo no Brasil, contrariando as políticas públicas adotadas em um Estado Democrático de Direito. Ora, este Jurista é professor da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, curso obrigatório para quem almeja ascender ao generalato, ou seja, todos os generais do Exército cursaram esta escola, e uma grande parte – dos que estão no Comando atualmente – aprenderam na cartilha deste Professor. Entretanto, prefiro acreditar que a publicação do livro negando o racismo tenha sido uma atitude isolada de algum oficial, embora, como cidadão brasileiro, acredito que a Força Terrestre vai publicar algum livro reconhecendo o racismo no Brasil (não é “camuflando” o problema que iremos resolvê-lo), pois não seremos grande como Nação enquanto existir números estarrecedores – como os divulgados pelo IPEA, PNUD e IBGE – que demonstram, claramente, as distorções entre os negros e os brancos brasileiros.

Concluindo, em um País que é indubitável a dificuldade para o negro progredir, quando um homem branco, jurista renomado, professor universitário e milionário se diz discriminado como cidadão comum, das duas uma: ou ele não quer que o Brasil seja grandioso; ou ele, realmente, está perdendo espaço, pois nesta terra estão acabando com as castas e os privilégios. Por fim, de um Negro para um jurista branco: pela grandiosidade do Brasil, reveja seus conceitos!


* Quem sou eu

Capitão Marinho
Estudei da alfabetização à terceira série do ensino médio - toda vida escolar - no Colégio da Polícia Militar da Bahia; Mestre em Direito pela UCAM-RJ; Capitão do Exército; Graduado em Ciências Militares pela Academia Militar das Agulhas Negras; Pós-graduado em Ciências Militares pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Exército; Graduado em Direito; Pós- Graduado em Direito Penal e Processo Penal; Pós-Graduado em Psicologia Jurídica; Gestor em Segurança Pública e Justiça Criminal pela Universidade Federal Fluminense.Em suma, uma pessoa que acredita, veementemente, que o estudo proporciona a realização dos sonhos mais difíceis, pois o conhecimento produz poder!

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Francisco de Paula Brito Primeiro Editor Brasileiro

MUSEU AFRO BRASIL REVELA EM EXPOSIÇÃO A TRAJETÓRIA DOPRIMEIRO EDITOR BRASILEIRO
Museu Afro Brasil revela a trajetória de Paula Brito, o precursor da história editorial brasileira
Exposição: Francisco de Paula Brito – 200 Anos do Primeiro EditorBrasileiro (1809-2009)
Período: 05/12/2009 a 25/01/2009 Local:
Museu Afro Brasil – Organização Social de Cultura Endereço: Av. Pedro Álvares Cabral, s/n – Parque Ibirapuera – Portão 10
Funcionamento: de terça a domingo – das 10 às 17 horas (permanência até às 18 horas)
Estacionamento: Portão 3 – Parque Ibirapuera (Zona Azul)
Entrada: Grátis
Informações à Imprensa Claudia Alexandre Assessoria de Imprensa Museu Afro Brasil – Organização Social de Cultura
(11) 5779-0593 ou (11) 9172-4662 // 7881-2688 ID 86*201-11
Francisco de Paula Brito, de aprendiz de tipografia a maior personalidade da história editorial do Brasil.
A exposição Francisco de Paula Brito – 200 Anos do Primeiro Editor Brasileiro (1809 – 2009), que foi inaugurada no próximo dia 05 de dezembro, às 13 horas, no Museu Afro Brasil – Organização Social de Cultura, revela a história do iniciador do movimento editorial brasileiro e sua contribuição valorosa no progresso da arte tipográfica. A realização é do Museu Afro Brasil e Governo do Estado de São Paulo, com patrocínio da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e apoio da Prefeitura de São Paulo.
Em plena sociedade escravista Paula Brito foi tipógrafo, litógrafo, editor, jornalista, tradutor, poeta, contista e teatrólogo. A mostra reúne obras que foram impressas, traduzidas e escritas por este carioca, que foi também um dos primeiros contistas brasileiros. Entre os livros estão os 37 volumes da gigantesca Coleção Brasiliana, que pertencem à Biblioteca José e Guita Mindlin e foram impressos pelo próprio Paula Brito entre 1837 e 1862. Outras 10 publicações são da coleção particular do diretor-curador do Museu Afro Brasil, Emanoel Araujo, que também assina a curadoria desta mostra. A exposição conta com painéis, imagens das principais publicações e cenas do cotidiano da cidade natal, Rio de Janeiro do século XIX. O público pode conferir de perto uma centenária prensa alemã da marca Krause, usada para trabalhos de litografia em produções editoriais.
Na qualidade de contista, o negro Francisco de Paula Brito (1809-1861) é um dos precursores do gênero no Brasil. Nasceu no Rio de Janeiro, em 2 de dezembro de 1809 e morreu na mesma cidade em 1 de dezembro de 1861, portanto 27 anos antes da Abolição da Escravatura no Brasil. Iniciou sua carreira na adolescência como aprendiz da Tipografia Nacional. Em 1827 foi contratado pelo recém fundado Jornal do Comércio como compositor tipográfico, assumindo mais tarde o departamento de Impressão. Em 1831, tornou-se dono da loja de encadernação de livros de um primo, quando inicia uma revolução com a introdução da tipografia, tornando-se o primeiro editor do país. A “Tipografia Fluminense de Brito & Cia” passou a ser um ponto de encontro de políticos e intelectuais como Machado de Assis. De sua tipografia saíram obras como “O Mulato” e o jornal “O Homem de Cor”, a primeira revista cultural de importância, a “Guanabara” e o primeiro jornal brasileiro dedicado à luta contra o preconceito racial, o que lhe rendeu mais um título, o de precursor da imprensa negra.
Engajado na luta abolicionista, ele militava contra a escravidão e a favor da igualdade racial, antes mesmo de expoentes da causa como José do Patrocínio e Joaquim Nabuco terem nascido. Com Francisco Manuel da Silva, autor do Hino Nacional Brasileiro, compôs o “Lundu da Marrequinha”. Seus contos e novelas são publicados a partir de 1839: “O triunfo dos indígenas”; “Os sorvetes e o Fidalgo Fanfarrão”; “A revelação póstuma”, “ A mãe-irmã” e “O enjeitado”, entre outros.

sábado, 5 de dezembro de 2009

O Grito de Belém

JB 05 de dezembro de 2009

O grito de Belém

Cristovam Buarque

Nesta semana, das margens do Amazonas, no moderno centro de convenções de Belém, o mundo recebeu um grito de alerta entoado por representantes de 156 Estados-membros da UNESCO, entre eles, 93 ministros da educação.
O cenário da floresta – cujo desmatamento simboliza uma das causas da grave crise ecológica – emoldurou o Grito de Belém, que trata do problema da educação e da alfabetização de adultos.
O Grito de Belém é o resultado da VI Confintea – Conferência Internacional de Educação de Adultos, convocada pela UNESCO a cada 12 anos.
Desde 2003, o Brasil foi escolhido como sede da reunião, depois daquelas realizadas em Elsinore, Dinamarca, 1949; Montreal, Canadá, 1960; Tóquio, Japão, 1972; Paris, França, 1985 e o último em Hamburgo, Alemanha, 1997.
É em Hamburgo que está a sede do Instituto da UNESCO para Educação ao Longo da Vida, que organiza essas conferências. Como membro do Conselho desse Instituto há 5 anos, fiquei muito satisfeito com o início dos trabalhos da VI Confintea.
Também senti a força dos discursos de abertura que mostram o compromisso de tantas pessoas com a educação no mundo.
A nova Diretora-Geral da UNESCO, Irina Bokova, lembrou que a Declaração Universal dos Direitos Humanos incluiu o direito de cada um a educação, e que – 60 anos depois – ainda necessitemos reafirmar esse direito.
Disse que “nenhum país subiu a ladeira do desenvolvimento humano sem fortes investimentos em educação”. Concluiu o discurso citando Paulo Freire e dizendo: “educação é condição para liberdade”.
A princesa Laurentien, da Holanda, representante especial da UNESCO para Alfabetização, falou sobre a necessidade de esforço mundial pela educação de todos os adultos – especialmente na alfabetização.
E disse: “se quisermos educar uma vila, eduquemos suas mulheres”.
O ex-presidente do Mali, Alpha Konare, concentrou sua fala na defesa do continente africano, onde o problema da falta de acesso à educação se mostra da forma mais drástica.
Referiu-se ao Presidente Lula como “nosso patrimônio comum” e defendeu a ideia, nascida em 1998, em Brasília, de se fazer a troca da dívida por investimentos em educação.
O Diretor do Instituto da UNESCO para Educação ao Longo da Vida, Adama Ouane, propôs uma estratégia para que o mundo enfrente o problema do analfabetismo de adultos e ofereça educação continuada para todos.
No conjunto, os representantes de todos os países presentes defenderam a necessidade de um esforço mundial pela alfabetização e educação de adultos.
Esse Grito de Belém não receberá a divulgação do grito que esperamos que seja dado em Copenhague, na próxima semana, por uma redução nas emissões de CO2.
Mas é a manifestação de pessoas comprometidas com a busca de um futuro a ser construído sobre dois pilares: educação de qualidade para todos e o equilíbrio ecológico para próximas gerações.
Ainda mais quando se sabe que a solução para o problema do meio ambiente está em uma revolução educacional para mudar a mentalidade viciada da civilização industrial, que mede o progresso pela produção industrial a qualquer custo – social ou ecológico.
A VI Confintea escolheu Belém por respeitar a importância da questão ambiental.
Esperemos que a reunião de Copenhague abra um debate mundial sobre a educação de adultos e faça todos perceberem que ela só será solucionada quando as crianças forem educadas na idade certa.
Tenho defendido, e levarei a Copenhague, no encontro da União Internacional de Parlamentares, a ideia de que o mundo exige que cada político seja uma voz em defesa do mundo e não só dos interesses locais de onde exerce sua atividade política.
É isso que me fez, nos últimos dias, falar sobre a imoralidade política no DF, mas sem deixar de usar esse espaço neste jornal para falar dos gritos de Belém e de Copenhague.
Esperamos que o Grito de Belém e o Grito de Copenhague se juntem em um Canto de Esperança para todo o mundo e todas as gerações do futuro, graças à educação de qualidade para todos e a um desenvolvimento sustentável para a civilização.

Cristovam Buarque é senador pelo PDT-DF